quarta-feira, 14 de março de 2012

Ahhh, Teresa!






Por Juliana Ramiro


Dia de chuva bate aquela melancolia e a nostalgia me assola. Gosto de lembrar o passado e utilizo meus livros para recordar minhas próprias histórias. Depois de assistir um pouco de TV resolvi sentar na frente da estante de livros e buscar nas minhas anotações e inúmeras páginas dobradas algo que já tivesse lido, gostado e que voltasse a conversar comigo. Entre os livros achei Teresa, de Manuel Bandeira.
Ahhh, Teresa, por muito tempo achei que não existiam pessoas como tu, ou que eu, infelizmente, nunca conseguiria me apaixonar por alguém assim. Para quem não conhece os versos de Teresa, aqui estão:


“A primeira vez que vi Teresa
Achei que ela tinha pernas estúpidas
Achei também que a cara parecia uma perna


Quando vi Teresa de novo
Achei que os olhos eram muito mais velhos que o resto do corpo
(Os olhos nasceram e ficaram dez anos esperando que o resto do corpo nascesse)


Da terceira vez não vi mais nada
Os céus se misturaram com a terra
E o espírito de Deus voltou a se mover sobre a face das águas.”


Para mim o difícil de ter uma Teresa sempre foi resistir os primeiros olhares. Perceber seus olhos velhos, suas pernas estúpidas e mesmo assim lhe dar tempo. Tempo para que pudesse misturar meu céu e minha terra, mexer nos meus sentidos, trazer-me a paz e, junto, uma história sobre águas claras e tranqüilas.


Sempre achei que para ser amor tinha que ser forte, avassalador, quente demais, dolorido demais, apaixonante demais. Mas só quando se dá espaço a uma verdadeira Teresa é que se descobre que a tranqüilidade e amor, na maioria das vezes, caminham juntos.


E se descobre que o amor nem sempre acontece quando pousamos nossos olhos sob a pessoa mais bela, a mais emocionante, a mais cheia de mistérios, a que nos tira mais do sério logo que a conhecemos. Pessoas assim, nas experiências que tive, mostraram-se Teresas ao contrário. Num primeiro momento, diante dos meus olhos pareciam anjos, seres de outro esfera, capaz de mexer com a terra, o céu, o ar, tudo. Num segundo momento, cometem um deslize que ainda não estamos aptos a perceber, pois ainda estamos sob o efeito do primeiro contato. Da terceira vez que estamos diante dessas falsas Teresas, seus olhos penetrantes e pernas celestiais dão espaço a atitudes estúpidas.


Não sei se todos concordam comigo, mas a vida me ensinou que mais vale darmos tempo a Teresas de olhos velhos e pernas estúpidas para que atinjam e deixem nosso coração em paz, do que apostar em falsas Teresas que nos cativam com a beleza porque por dentro não têm mais o que nos oferecer.


Saudações a todas as Teresas que existem no mundo. E aqueles que sabem apreciá-las.


* Texto lido no programa Eu tô falando de amor, da rádio 2 IGUAIS, dia 14/03

quinta-feira, 8 de março de 2012

Quem nunca amou ao menos uma mulher na vida?




Por Juliana Ramiro


Quem nunca amou ao menos uma mulher na vida? Posso dizer que amei algumas. Não sou feminista, não sou a favor de comparações entre os sexos, este texto é uma extensão daquilo que venho sentindo desde antes de vir ao mundo, quando me apaixonei pela primeira vez e pela mulher mais importante da minha vida: minha mãe.

Abdicar de noites de sono, do corpo naturalmente perfeito, se permitir engordar, inchar, desequilibrar e gerar. Servir de casa, de abrigo para um novo ser que vem ao mundo. Se Deus assim o quis, é por que só a mulher seria capaz de desempenhar este papel com tamanha maestria. Mesmo com todas as dificuldades do dia-a-dia desta missão sei que ela me amou e eu a amei desde o primeiro instante que nos tornamos uma a realidade da outra.

Depois, nos primeiros anos de vida, descobri que existia outra mulher pela qual estava de quatro. Seu jeito doce, compreensivo, de quem já passou por um bocado de coisas na vida e saberia me entender e aconselhar sempre que eu precisasse de ajuda, deixou-me encantada. Tenho muitas lembranças felizes com meu avô na infância, na adolescência, agora, deitar no colo da minha avó e receber sua mão trêmula, indo e vindo nas minhas costas, foi, certamente, uma sensação única, da qual morro de saudade.

Depois vieram outras mulheres. Minhas tias, elas eram as mulheres que eu gostaria de ser quando crescesse. Determinadas, engraçadas, estudiosas, elas me ensinaram a amá-las e amar estar na companhia delas.
Tenho certeza que amei minha primeira babá. Ela podia ter alguns muitos defeitos, mas paciência era uma das suas maiores virtudes. Com ela aprendi a gatinhar, a dar meus primeiros passos, comer alimentos diferentes, crescer. Eu a amava por tudo isso e, também, por que ela me matinha entretida, até que a mulher da minha vida voltasse para casa, para mim.

Depois amei a minha professora do jardim. Lembro até hoje que ela chegava na sala de aula, tirava seus sapatos de salto alto, punha nos pés um chinelo Havaianas e sentava no chão para nos apresentar, todos os dias, um mundo novo. Depois dela, amei a professora que me ensinou a ler, que entendeu minha inquietude em saber mais, e sempre mais, e não fez disso um motivo para advertências. Amei algumas professoras que reconheceram e estimularam os meus talentos para por no papel aquilo que sempre tive dificuldade de fazer sair pela boca.

Amei algumas amigas, que pude contar em momentos decisivos de minha vida. Admirei mulheres que, mesmo em tempos difíceis, riscaram seus nomes na história, na minha história.

No ano passado, amei a primeira mulher que não fez esforço algum para que nascesse esse sentimento dentro de mim. Lembro que foi amor a primeira vista, eu a vi, enchi meus olhos de lágrimas e soube que era para sempre. A Vitória, minha irmã-afilhada, despertou e vem despertando em mim uma nova modalidade de amor.

Sei que o lugar dessas mulheres que amei, e amo, poderia ter sido preenchido por homens. Mas tenho plena certeza que seria totalmente diferente. Para mim, uma pessoa é capaz de passar a vida inteira sem amar um único homem, agora não existe quem não tenha se visto amando uma mulher.


*Texto lido no programa EU TÔ FALANDO DE AMOR, na rádio 2 Iguais, do dia 8/03, em homenagem ao dia internacional da MULHER.